O Ano em que nasci – Parte I (1941 e 1942)
Como ficou acordado, iniciamos hoje a publicação das colaborações dos atriunistas no âmbito da actividade O Ano em que nasci.
Iremos fazer esta publicação por ordem cronológica, dos anos mais antigos para os mais recentes, e assim esta primeira parte conta com as participações do Alberto Magalhães (Ano de 1941) e do Albano Pereira (Ano de 1942).
1941 – NO MEIO
DA 2ª GUERRA MUNDIAL
Nasci, na Cidade do Porto, em 26 de Julho de 1941.
O meu pai era Tenente de Engenharia, foi mobilizado para os Açores e embarcou para o Faial no Navio Niassa em 15 de Julho desse ano.
(30 anos depois, em Abril 1971, fui eu para a guerra de Angola no Navio Vera Cruz).
A minha mãe, os
meus irmãos e eu partimos para o Faial no Navio Carvalho Araújo onde chegámos a
30 de Dezembro.
Os Açores
devido à sua localização geográfica eram de importância fulcral para ambos os
lados do conflito.
É de salientar
algumas notícias importantes dadas por jornais e rádios no ano de 1941:
- De 7 a 10 de
Maio de 1941, num combate entre navios de guerra Alemães e Britânicos, um navio
alemão portador da máquina Enigma, foi capturado o que permitiu aos
aliados decifrar o código de transmissões alemão. Este facto contribuiu muito
para a vitória dos aliados
- A 22 de Junho
a URSS, entrou na guerra, ao lado do Reino Unido contra a Alemanha, quando o
seu território foi invadido de surpresa pelas tropas de Hitler.
- A 7 de
Dezembro a base americana de Pearl Harbour, nas ilhas Havai no Pacífico, é
bombardeada por aviões japoneses provocando a morte de 400 pessoas e a
destruição de 14 navios de guerra e de 343 aviões. Este facto determinou a
entrada da guerra dos EUA ao lado do Reino Unido.
- Em Dezembro
de 1941 uma força conjunta de tropas holandesas e australianas ocupou
calmamente Timor apesar dos protestos do Governador local. Portugal anunciou
então o envio de tropas portuguesas para substituir as forças aliadas, mas os
japoneses já tinham ocupado a ilha em Fevereiro de 1942.
Em 1941 Lisboa
era uma cidade cheia de refugiados que aguardavam uma viagem para a América.
Muitos destes refugiados vestiam-se descontraidamente e faziam-se notar nas
praias com os seus fatos de banho mais leves. Os Lisboetas nunca tinham
visto mulheres de calças, sentadas nas esplanadas e a fumar…
Portugal atraiu
os serviços de propaganda e espionagem dos principais campos beligerantes. Aqui
actuaram os serviços secretos alemães, britânicos, italianos, franceses, norte
americanos, polacos, checos, romenos e até soviéticos que se moviam com relativa
impunidade.
Em Portugal
houve um grande ciclone, de 14 a 16 de Fevereiro com chuva e vento muito fortes
que provocaram grandes cheias. Mais de 100 pessoas morreram, muitas habitações,
estradas e linhas de caminhos de ferro sofreram grandes destruições. (Creio que
os efeitos deste ciclone ficaram muito marcados nos portugueses de então pois
quando era muito novo -5 ou 6 anos- muitas vezes os meus primos mais velhos e
os meus tios quando me viam diziam: olha aqui está o miúdo que nasceu no
ano do ciclone).
Termino com uma
das grandes preocupações de Salazar durante a guerra: as medidas dos fatos de
banho dos homens e das mulheres usados nas praias e piscinas, como se pode ver
na fotografia junta.
Março de 2021
Alberto
Magalhães
O ANO EM QUE EU
NASCI – 1942
Este meu
depoimento foi feito a partir de pequenas histórias/memórias relatadas por meus
pais e familiares ou factos encontrados
em leituras posteriores referentes a esse ano 1942.
Elencarei a
seguir algumas dessas situações que são o meu imaginário de 42.
- A GUERRA – A BATALHA DE ESTALINEGRADO
A guerra foi o acontecimento que marcou 1942. Teve consequências terríveis em todo o mundo. Consequências que anos depois fui descobrindo nas leituras que fazia de um tema que sempre me interessou. Houve, no entanto, um acontecimento passado em 1942, que me marcou profundamente quando na Faculdade me chegou às mãos o livro “Dias e noites de Estalinegrado”. A heroica luta, durante o cerco da cidade, do povo e soldados soviéticos, empolgou-me. Foi a primeira grande derrota da Alemanha nazi.
Percebi que o
rumo da Guerra tinha mudado nesse ano de 1942. A vitória dos Aliados parecia
possível. E. segundo alguns autores, Portugal foi assim poupado a uma ocupação
alemã.
- OS EFEITOS DA
GUERRA EM PORTUGAL
A falta de géneros alimentares – O Racionamento.
Embora os malabarismos de Salazar tenham evitado a entrada de Portugal na Guerra, não nos livrámos dos seus efeitos. A fome atinge as famílias operárias das grandes concentrações industriais e sobretudo os assalariados rurais.
Por isso desencadeiam-se
em fins de 1942 as maiores greves e outras manifestações de protesto de que há
memória na ditadura.
O racionamento
afetava também a classe média. Facto de que tomei conhecimento por relatos dos
meus pais.
À espera do invasor
Em início de 1942 instala-se em Portugal a psicose de uma invasão alemã/espanhola, em resultado da anunciada concessão da Base das Lajes aos aliados. Cria-se nesse ano a Defesa Civil do Território (DCT). O meu pai contou-me a histórias das tiras de papel coladas nas janelas e outras como os alertas, as corridas para os abrigos, a proteção dos monumentos, etc.
A propaganda
Em 42 por todo o lado bombardeava-se a opinião pública com a denominada “guerra da propaganda”. Do Governo, dos aliados e da Alemanha. Eram publicações, cartazes, rádio e cinema que tentavam ganhar adesões. Muitas das publicações aliadas, guardadas por meu pai, foram as minhas primeiras leituras da adolescência.
PORTUGAL 1942
A REPRESSÃO
Dois acontecimentos ocorridos em 42 marcaram-me muito, quando mais tarde deles tomei conhecimento. São a morte de Bento Gonçalves, secretário-geral do PCP, no campo de concentração do Tarrafal e o assassinato a tiro pela PVDE do médico comunista Ferreira Soares no seu consultório (14 balas).
Uma foto, de
1942 (28 de julho), fica também para mim como exemplificativa destes tempos
duros. Uma foto que diz mais do que mil palavras. Na foto ( F5 ) tirada , na
travessa do Baluarte, pôr um repórter de
“O Século” que se tinha deslocado á zona operária de Alcântara para cobrir a
greve de trabalhadores da fábrica Sol
/CUF , pode-se observar a PSP a carregar
sobre um grupo de mulheres e uma criança , familiares dos operários em greve.
Todos os
relatos desses acontecimentos referem o importante papel das mulheres nessas
lutas.
Projetado pelo arq. Keil do Amara, foi inaugurado em outubro de 1942. Tornou-se desde logo um dos lugares favoritos dos lisboetas para os passeios nos fins-de-semana. Ir “ver os aviões “levantar voo ou aterrar com enormes intervalos de tempo, era o programa para as tardes de domingo.
Tendo ido morar
para o Bairro da Encarnação em 45, as idas ao aeroporto com amigos do bairro passaram
a ser muito frequentes, nos anos 50.
Nesse ano estraram-se dois filmes portugueses que embora muito diferentes marcaram o cinema nacional. Refiro-me a “O Pátio das Cantigas “de Francisco Ribeiro e “Aniki-Bóbó” de Manuel de Oliveira. No primeiro caso um sucesso de audiências com os primeiros ídolos cinematográficos. No segundo um filme de crianças abre caminho para um novo cinema português, embora passando desapercebido do público e da maioria da crítica. São filmes que revi muitas vezes.
Lançados em
1933, como obra emblemática do regime, estes bairros implantados geralmente em
zonas afastadas relativamente ao tecido urbano da cidade, pretendiam de certa
forma copiar o modelo da aldeia portuguesa.
O Bairro da
Encarnação teve a entrega das primeiras casas em 1942, tendo para lá ido morar
em 1945.A nossa juventude foi passada nesse bairro, o que nos marcou
profundamente. As brincadeiras nos quintais e nos terrenos envolventes são
recordadas com agrado.
Março de 2021
Albano Pereira
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