O Atrium de régua e esquadro, à descoberta de Duarte Pacheco
Esta iniciativa repartiu-se por dois
dias consecutivos. No dia 31 de Maio, da parte da tarde, no Instituto Superior
Técnico, uma das obras emblemáticas de Duarte Pacheco, realizou-se uma conferência
pela Doutora Sandra Vaz Costa, intitulada “O país a régua e esquadro. A obra
pública de Duarte Pacheco”. Foi uma comunicação interessante que nos deu a
conhecer o homem no seu tempo e através da realização da sua obra, que
transformou a paisagem urbana da cidade de Lisboa e também de parte importante
do nosso país.
Na sua rica comunicação, fruto de uma
profunda investigação, Sandra Vaz, mostrou-nos o homem dinâmico, o organizador
determinado, que soube sempre concretizar os seus projectos de modernidade,
dentro de um regime político que privilegiava o culto do passado e das ideias
mais retrogradas, na organização da sociedade. Mesmo ocupando cargos políticos
relevantes, Ministro das Obras Públicas e Presidente da Câmara Municipal de
Lisboa, Duarte Pacheco era um homem incómodo para grande parte das classes
sociais que apoiavam a ditadura de Salazar, especialmente para os proprietários
da terra, a quem ele fazia a vida negra com as suas expropriações
intempestivas.
No entanto, quando a obra a fazer era
mais importante para o regime do que os protestos de alguns dos seus apoiantes,
como foi o caso da Exposição do Mundo Português de 1940, o velho ditador
recorria aos serviços, sempre eficientes de Duarte Pacheco.
No final saímos, daquela que foi a escola
de Duarte Pacheco, mais conhecedores de uma personagem que deixou uma marca
relevante na paisagem construída da nossa Lisboa e de parte do nosso país.
A segunda parte da iniciativa que
teve lugar no dia seguinte, 1 de Junho, compreendeu uma visita, orientada pelo
Albano e pelo José Cid, a algumas das obras mais representativas de Duarte
Pacheco, na cidade de Lisboa.
O percurso iniciou-se pela Fonte
Luminosa, cuja designação oficial, francamente em desuso, é Fonte Monumental da
Alameda Afonso Henriques. Inaugurada em 1940, para celebrar o abastecimento
regular de água à zona oriental de Lisboa, ela completava um ambicioso projecto
concebido por Duarte Pacheco, que incluía o Instituto Superior Técnico, no
outro lado da Alameda. O Técnico nasceu primeiro, a Alameda só seria construída
depois, constituindo uma imensa passadeira verde que confluía na Monumental
Fonte.
O seu autor foi o arquitecto Carlos
Rebelo de Andrade, que desenhou um rigoroso e clássico sistema simétrico, com
três altas taças, das quais a água cai em jorros sobre um primeiro patamar do
lago semicircular. No segundo patamar um conjunto de estátuas é envolvido por
jactos de água, sendo a do centro representativa do Rio Tejo e as restantes, as
tágides, míticas criaturas criadas por Luís de Camões nos seus Lusíadas. A
ladear este conjunto dois corpos laterais com baixos-relevos de Maximiano
Alves.
A segunda paragem foi junto ao
monumento a António José de Almeida, o sexto Presidente da I República, de 5 de
Outubro de 1919 a 5 de Outubro de 1923. O monumento foi edificado segundo
projecto do arquitecto Pardal Monteiro e esculpido por Leopoldo de Almeida, tendo
sido inaugurado em 1937.
Nele está associada a figura do estadista à figura da República, que
sobressai por trás dele. É um local onde se presta homenagem aos heróis da
revolução republicana, e durante a ditadura constituiu um ponto de encontro
daqueles que lutavam pela liberdade.
De seguida apreciámos as casas
modernistas na Av. António José de Almeida, que foram construídas por
iniciativa de Duarte Pacheco e eram destinadas inicialmente aos professores do
IST, que o desejassem.
A visita prosseguiu para o edifício
do Instituto Nacional de Estatística, imóvel de um classicismo depurado, que foi
um dos primeiros edifícios públicos expressamente concebido para a finalidade a
que destinava. O seu projecto, que se insere num lote triangular que resultou
do arranjo urbanístico efectuado para a construção do Instituto Superior
Técnico, é também do arquitecto Pardal Monteiro tendo a sua construção sido
concluída em 1935,
De salientar o janelão da escadaria
principal com um vitral do pintor Abel Manta, de 1933, cujo tema é a representação
da Pátria, rodeada pelas diversas actividades económicas, e também os
baixos-relevos da sua fachada, da autoria de Leopoldo de Almeida, que
representam as diferentes “Estatísticas” respeitantes aos sectores da
Demografia, Agricultura, Comércio e Indústria.
Em seguida pudemos observar o bairro
social do Arco do Cego, cujas obras se iniciaram no tempo da I República, mas
que só foram concluídas na época de Duarte Pacheco, devido a problemas
financeiros.
A paragem seguinte foi o Liceu Filipa
de Lencastre, um projecto de 1932, da autoria dos arquitectos Jorge Segurado e
António Varela. A clareza da sua composição espelha a formação “Beaux-Arts” dos
seus autores e é típica do Modernismo Português.
De seguida fomos até à Casa da Moeda,
na Avenida Dr. António José de Almeida, cujos autores foram também os
arquitectos Jorge Segurado e António Varela. Trata-se de outro exemplar do
Modernismo Português, de formas geométricas simples que destacam a simetria do
conjunto. A ligação entre o conjunto industrial e o edifício administrativo é
feita por dois passadiços aéreos que emprestam uma natureza peculiar ao
complexo arquitectónico.
A visita concluiu-se na Igreja de
Nossa Senhora de Fátima, na Avenida Marquês de Tomar, um projecto de 1934 do
arquitecto Pardal Monteiro, cuja inauguração teve lugar em 1938. A sua
concepção “tipicamente moderna” não deixou de causar alguma polémica nos meios
mais tradicionais da sociedade portuguesa que a acusavam de contrariar a
afirmação nacionalista que era dominante. Refira-se no entanto que o então
Cardeal Patriarca de Lisboa veio a público defender o projecto da igreja,
apelidando-a de “igreja moderna bela”. De facto várias revistas estrangeiras da
época destacaram a sua concepção inovadora na procura de valores estéticos
aliados à função litúrgica. Ela constitui a única igreja modernista existente na
nossa capital.
A participação de vários artistas
plásticos, nomeadamente de Almada Negreiros, com magníficos vitrais, mas também
de Leopoldo de Almeida e de Francisco Franco, acrescentaram um especial
interesse neste imóvel.
Esta deambulação pelo património que
nos foi legado por Duarte Pacheco, foi rematada com uma alegre sardinhada no
Grupo Dramático e Escolar os “Combatentes”, em Campo de Ourique.
2 Comments:
Muito boa reportagem, com excelentes fotografias, a dar conta de uma actividade também muitissimo interessante.
Obrigada a dinamizador, coordenadores, fotógrafos, etc., etc.
MEugénia
Excelente programa, reportagem, fotos, participantes e atualização do blogue.
MCMC
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