Passados cem anos, o Atrium mergulhou nas trincheiras da Grande Guerra
Sarajevo, 28 de Junho de 1914, o dia tinha nascido soalheiro.
Nas ruas o bulício tranquilo da capital da Bósnia-Herzegovina fora interrompido
com o lançamento de uma bomba contra o carro que transportava o arquiduque
Francisco Fernando, sobrinho do imperador austríaco Francisco José e herdeiro
do trono austro-húngaro, que estava de visita à cidade.A explosão falhara o alvo e o sérvio Gavrilo Princip, de 19
anos, implicado na conjura para assassinar o arquiduque com mais 5 jovens
sérvios, já dera o atentado como falhado e entrara numa cafetaria para comer
qualquer coisa. De repente vê o carro de Francisco Fernando, que se enganara no
caminho, a fazer vagarosamente uma inversão de marcha, mesmo em frente da loja.
Não hesita, num ápice salta para a rua empunhando a sua Browning 7.65 e dispara
matando o arquiduque e sua mulher, Sofia.O pretexto para o desencadear das hostilidades, há muito
aguardado, estava criado. A guerra que iria “acabar com as guerras”, no dizer
de H. G. Wells, iria começar. Mas ao contrário das previsões ela não seria a
última das guerras, nem seria breve (o Estado-Maior alemão previa a capitulação
da França em seis semanas…). Ela foi a maior e a mais mortífera guerra até
então travada, e criou a semente que conduziria, vinte anos depois, ao pesadelo
nazi e a uma nova guerra mundial, ainda mais mortífera.
Foi na noite de 20 de Junho - exactamente cem anos menos oito
dias depois - que o Atrium realizou uma sessão na Junta de Freguesia de Carnide,
assinalando o início da Grande Guerra.
A sessão compreendeu três partes distintas: Na primeira, pelo
José Cardim foram analisadas as “Causas,
a Evolução e as Consequências do Conflito”, na segunda foi projectado um
filme, da autoria do Zé Carlos, sobre a participação portuguesa nas trincheiras
da Flandres, intitulado “Portugal na
Grande Guerra: Um país rastejando pelas trincheiras”, e na última o Albano desenvolveu o tema “A Arte em Tempo de Guerra”.
Com a preciosa ajuda do José Cardim, fomos então conduzidos a
uma viagem no tempo, passando em revista os acontecimentos históricos que
conduziram à guerra: O desenvolvimento e a crescente tensão entre os grandes
Impérios; o fenómeno do pangermanismo e o consequente aumento do poderio
alemão; a explosão industrial que, segundo a expressão popular, “escolheu os
canhões em vez da manteiga”; A perda do domínio do mar pela Inglaterra, em
favor da Alemanha; A política de Alianças na Europa, que punha frente a frente
a Tríplice Aliança (Alemanha, Áustria-Hungria e Itália, mais tarde substituída
pelo Império Otomano) e a Tríplice Entente (Inglaterra, França e Rússia).
E, finalmente, chegamos à faísca que fez explodir esta guerra
já anunciada: o atentado de Sarajevo. Tudo se precipita então com uma rapidez vertiginosa:
A Áustria declara guerra à Sérvia e bombardeia Belgrado; a Rússia declara a
mobilização geral e prepara-se para apoiar a Sérvia; a Alemanha declara guerra
à Rússia e à França; a Inglaterra num primeiro momento ainda hesita e tenta
parar a Alemanha através de concessões em África (a célebre partilha das
colónias portuguesas de Angola e Moçambique, entre Londres e Berlim), mas após
a invasão da Bélgica pelas tropas alemãs, decide entrar na guerra. O cenário
estava montado, a dramática “representação”, que contaria com um total de mais
de 65 milhões de “intérpretes” em armas, só iria terminar quatro anos e muitos milhões
de mortos, depois.
No meio dos horrores produzidos pela primeira guerra
tecnologicamente avançada no armamento (metralhadores, gases tóxicos, tanques,
aviação, artilharia pesada com alcance de várias dezenas de quilómetros, etc.),
mas dramaticamente obsoleta na táctica militar, o que originou baixas humanas pesadíssimas (só na batalha de Somme, que custou 200 mil vidas aos ingleses, 40
mil aos franceses e 170 mil aos alemães, o balanço foi o avanço de uns escassos
dez quilómetros no terreno, pelas tropas da Entente…), somos confrontados com um
momento de intenso significado humano.
No Natal de 1914, de um modo espontâneo, soldados britânicos
e alemães, estabeleceram, contra as ordens superiores, uma trégua informal em
muitos pontos da frente ocidental. Primeiro com algum receio, mas depois mais à
vontade, começam a sair das trincheiras dos dois lados e encontram-se na “terra
de ninguém”, geralmente coberta de cadáveres. Os homens que horas antes se
tentavam abater começaram a trocar cigarros, alguma comida e até houve um jogo
de futebol entre as duas “selecções”. Os registos fotográficos que fixaram estes
momentos (que obviamente foram alvo de uma tentativa de censura, pelos poderes
de ambas as partes), são impressionantes e constituem um testemunho cruel de
como se instrumentalizam homens para matar os seus iguais, em nome de
interesses mercantis e de conquista de poder pelas castas dominantes.
Na última parte da sessão, o Albano mostrou a influência da Grande Guerra nas vanguardas artísticas dessa época, que coincidiu com um período de grande vitalidade dos movimentos de vanguarda europeus. Foi uma interessante abordagem na qual, pela palavra e pela imagem, passaram diante de nós diferentes casos exemplares. Desde os que inicialmente viam a GUERRA como uma oportunidade de destruição da ordem antiga -“a higiene do mundo…”- até às dolorosas experiências vividas por muitos artistas que por isso mudaram radicalmente as suas eufóricas posições iniciais; falou-se do caso exemplar do pintor português Adriano de Sousa Lopes; também a Banda Desenhada, desde o “Quim e Manecas”, criação de Stuart Carvalhais, até aos mais recentes trabalhos de Tardi, de uma beleza crua e fortemente contestatária da guerra, também marcaram a sua presença.
Na última parte da sessão, o Albano mostrou a influência da Grande Guerra nas vanguardas artísticas dessa época, que coincidiu com um período de grande vitalidade dos movimentos de vanguarda europeus. Foi uma interessante abordagem na qual, pela palavra e pela imagem, passaram diante de nós diferentes casos exemplares. Desde os que inicialmente viam a GUERRA como uma oportunidade de destruição da ordem antiga -“a higiene do mundo…”- até às dolorosas experiências vividas por muitos artistas que por isso mudaram radicalmente as suas eufóricas posições iniciais; falou-se do caso exemplar do pintor português Adriano de Sousa Lopes; também a Banda Desenhada, desde o “Quim e Manecas”, criação de Stuart Carvalhais, até aos mais recentes trabalhos de Tardi, de uma beleza crua e fortemente contestatária da guerra, também marcaram a sua presença.
Foi um serão enriquecedor que permitiu uma reflexão sobre um
acontecimento histórico de excepcional importância no seu tempo, mas cujas
consequências se estendem, sem qualquer dúvida, até aos nossos dias.
No domingo seguinte, 22 de Junho, tivemos a oportunidade de
completar a evocação da Grande Guerra, com a visita comentada pelo Cardim e
pelo Albano ao Museu Militar onde, para além de armamento, se observaram as
magnificas pinturas de Adriano de Sosa Lopes. A actividade terminou com uma
visita à exposição patente no forte do Bom Sucesso, intitulada “Uma trincheira portuguesa
na Grande Guerra”.
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