25 Abril 74 - as memórias da Luísa
Tinha feito 19 anos no mês de março. Trabalhava desde
agosto do ano anterior num despachante oficial, no edifício da Alfândega, em
Alfama.
Nesse dia, ainda me preparava para sair, quando telefona a minha vizinha do 5ºandar, a Dª Maria do Carmo, em grande alarme, dizendo “Luisinha, não podes ir trabalhar, há tropas na baixa, parece que é um golpe de Estado, fica em casa”. É claro que não fiquei. Não sei o que era mais forte, se o sentido de responsabilidade de ir trabalhar ou a curiosidade de ir ver o que se passava.
Vivia na Amadora, apanhava diariamente o comboio até ao Rossio e depois ia a pé até Alfama.
Sem qualquer dificuldade, apanhei o comboio e do Rossio segui pela Rua Augusta até encontrar uma barreira que me avisou que não podia passar. Daquele ponto via-se a Praça do Comércio e movimentações, carros militares e muitos soldados.
Não desisti e cortei para a Rua dos Fanqueiros na tentativa de chegar a Alfama. E foi então que assisti a uma cena que me deixou petrificada. Um homem com duas grandes cestas (devia vir da praça da Ribeira) corria rua acima a chorar e a gritar, “Oh que desgraça, o que nos vai acontecer?”. Fiquei assustada e a curiosidade deu lugar a um certo receio. De qualquer forma, não iria conseguir passar.
Dei a volta e segui para a estação do Rossio para apanhar o comboio de regresso a casa. Na estação, viam-se já grupos de pessoas a falar e algumas, avulsamente, a conjeturar sobre o que se estava a passar.
Chegada a Amadora, uma pequena multidão aguardava os “corajosos” que regressavam de Lisboa, à espera de notícias. Foi um acolhimento excecional. Da minha parte, não tinha muito que contar… Encontrei algumas caras conhecidas, alguns amigos que eu sabia estarem próximos do PC. Sentia-se no ar uma excitação, uma alegria em suspenso. Algo, uma esperança, nos mantinha ali, juntos.
Passado um pouco, chega novo comboio. Desembarca o meu irmão e o Pacheco, nosso amigo. Tinham ambos ido, logo de madrugada, à inspeção militar no quartel da Graça.
Dirigimo-nos a eles, a perguntar ansiosos, se sabiam o que se passava… “O quê? Mas de que é que estão a falar?”. Tinham estado no quartel, mas só souberam do “25 de abril” quando, chegados à Amadora, lhes contámos. Esta é uma situação caricata de que ainda hoje nos rimos.
Depois fomos para casa, os nossos pais aguardavam-nos, preocupados. Ficámos colados ao rádio e à televisão. E às informações que íamos recebendo dos amigos.
E o que se seguiu, todos nós sabemos. 25 de Abril, sempre!
Luísa, em Abril 2020
Nesse dia, ainda me preparava para sair, quando telefona a minha vizinha do 5ºandar, a Dª Maria do Carmo, em grande alarme, dizendo “Luisinha, não podes ir trabalhar, há tropas na baixa, parece que é um golpe de Estado, fica em casa”. É claro que não fiquei. Não sei o que era mais forte, se o sentido de responsabilidade de ir trabalhar ou a curiosidade de ir ver o que se passava.
Vivia na Amadora, apanhava diariamente o comboio até ao Rossio e depois ia a pé até Alfama.
Sem qualquer dificuldade, apanhei o comboio e do Rossio segui pela Rua Augusta até encontrar uma barreira que me avisou que não podia passar. Daquele ponto via-se a Praça do Comércio e movimentações, carros militares e muitos soldados.
Não desisti e cortei para a Rua dos Fanqueiros na tentativa de chegar a Alfama. E foi então que assisti a uma cena que me deixou petrificada. Um homem com duas grandes cestas (devia vir da praça da Ribeira) corria rua acima a chorar e a gritar, “Oh que desgraça, o que nos vai acontecer?”. Fiquei assustada e a curiosidade deu lugar a um certo receio. De qualquer forma, não iria conseguir passar.
Dei a volta e segui para a estação do Rossio para apanhar o comboio de regresso a casa. Na estação, viam-se já grupos de pessoas a falar e algumas, avulsamente, a conjeturar sobre o que se estava a passar.
Chegada a Amadora, uma pequena multidão aguardava os “corajosos” que regressavam de Lisboa, à espera de notícias. Foi um acolhimento excecional. Da minha parte, não tinha muito que contar… Encontrei algumas caras conhecidas, alguns amigos que eu sabia estarem próximos do PC. Sentia-se no ar uma excitação, uma alegria em suspenso. Algo, uma esperança, nos mantinha ali, juntos.
Passado um pouco, chega novo comboio. Desembarca o meu irmão e o Pacheco, nosso amigo. Tinham ambos ido, logo de madrugada, à inspeção militar no quartel da Graça.
Dirigimo-nos a eles, a perguntar ansiosos, se sabiam o que se passava… “O quê? Mas de que é que estão a falar?”. Tinham estado no quartel, mas só souberam do “25 de abril” quando, chegados à Amadora, lhes contámos. Esta é uma situação caricata de que ainda hoje nos rimos.
Depois fomos para casa, os nossos pais aguardavam-nos, preocupados. Ficámos colados ao rádio e à televisão. E às informações que íamos recebendo dos amigos.
E o que se seguiu, todos nós sabemos. 25 de Abril, sempre!
Luísa, em Abril 2020
4 Comments:
Da jovem despachante aduaneira, com a saudável curiosidade de sentir e viver a revolução, aos jovens mancebos inspecionados, que ficaram do lado de fora da história, passando pelo assustado feirante da Praça da Ribeira, um delicioso fresco do dia inicial inteiro e limpo trazido aqui pela Luísa nestas suas memórias do 25 de Abril.
Abraços para toda a comunidade do Atrium
Sem dúvida que, que uma das razões para a existência e longevidade do grupo é o fato de termos um forte elo comum,a forma aberta e intensa como participámos, de uma maneira ou de outra, naquele extraordinário momento da nossa história.
Abraço.
Luísa
Gostei muito do teu testemunho. Eras uma miúda muito madura e engraçada. Parabéns por essa cabeleira.
Abraços do
Berto
Gostei
Interessante
Das pequenas " histórias" se faz a " História " daqueles dias.
Bj
Albano
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