quinta-feira, março 19, 2015

O Atrium deambulando nos dédalos da renovada e multicultural Mouraria

Bem longe estava o nosso Afonso Henriques, depois da conquista de Lisboa, que ao atirar para fora da sua cidadela os mouros, estava a dar origem a um bairro que, passados mais de oito séculos e meio, se viria a transformar num verdadeiro melting-pot, onde se misturam gentes das mais variadas paragens e culturas (Cerca de 25% da população na Mouraria é imigrante, e existem pelo menos 51 nacionalidades diferentes a residir no bairro).
De facto, a Mouraria de hoje, que percorremos no passado dia 28 de Fevereiro, na companhia de dois jovens colaboradores da Associação Renovar a Mouraria (ARM), ambos emigrantes, um da República Democrática do Congo e outro do Bangladesh, apareceu-nos na sua diversidade étnico-cultural, onde se cruzam os talhos halal e os cabeleireiros do Bangladesh, com as tradicionais tascas e as mercearias portuguesas, onde o Centro Comercial do Martim Moniz se encontra paredes meias com a rua do Capelão, berço da Maria Severa e dessa canção lisboeta, hoje património da humanidade, e onde coexistem os templos católicos, dos quais sobressai a Capelinha da Senhora da Saúde e a sua ancestral procissão, velha de 444 anos, com as mesquitas, as igrejas evangélicas e os locais de culto de outras religiões.
Esta coexistência entre a tradição e os mitos do “bairro típico”, por um lado, e a nova comunidade multicultural, por outro, esta confluência de pessoas e de grupos sociais heterogéneos, por vezes é geradora de situações mais tensas, que justificaram algumas das práticas e políticas de intervenção sócio-territorial, visando gerir a diversidade de forma construtiva e inovadora.
Esta realidade é analisada num artigo do jornal local Rosa Maria, publicação da ARM, que transcrevemos: “Não existe uma visão consensual e homogénea sobre o que a Mouraria é. Apesar dos discursos recorrentes anexados a ela, e que estamos habituados a ouvir e ler, como sendo multicultural e berço do fado, existem também visões contraditórias em relação aos mesmos. A Mouraria é um bairro inserido em Lisboa, em que, constantemente, se tenta criar um discurso identitário de forma a destacar-se dos restantes, seja por necessidade ou por realidade. Contudo, existem tensões que a desmitificam”.
A visita guiada que efectuámos, está inserida no projecto Mouraria para Todos, iniciativa da Associação Renovar a Mouraria, uma organização comunitária criada em 2008, com o objectivo de revitalizar o bairro da Mouraria, nos diversos níveis, cultural, social, económico e turístico, visando a melhoria das condições de vida da população local.
Acompanhados pela simpatia dos nossos guias, percorremos alguns locais emblemáticos do bairro, num percurso que se iniciou junto da igreja de S. Domingos e que terminou num convívio na Casa Comunitária da Mouraria, sede da ARM, que contou com algumas especiarias gastronómicas oriundas das diversas regiões presentes no bairro, culminando com uma exibição de danças do Bangladesh.