Um sábado no sul, em terras alentejanas de Ferreira
Folheia-se o caderno e eis o sul
E o sul é a palavra. E a palavra
Desdobra-se
No espaço com suas letras de
Solstício e de solfejo
Além de ti
Além do Tejo.
E o sul é a palavra. E a palavra
Desdobra-se
No espaço com suas letras de
Solstício e de solfejo
Além de ti
Além do Tejo.
E foi mesmo
para o sul - a palavra neste inspirado verso do Manuel Alegre - que as
viaturas partiram de Lisboa, bem cedinho no passado sábado, 27 de Outubro, levando
os atriunistas e amigos até à vila bem alentejana de Ferreira do Alentejo.
O encontro
com o Francisco Horta, que nos iria guiar na visita, foi junto ao edifício da
Câmara Municipal, na Praça do Comendador Infante Passanha.
Mas antes de
iniciar a crónica da visita, uma pequena introdução à história desta simpática
vila, cujo topónimo está relacionado com uma tradição popular, segundo a qual,
por volta do século V, uma valente mulher, casada com um ferreiro, chefiou a
defesa do povoado dos invasores bárbaros.
Os vestígios
arqueológicos encontrados apontam para o povoamento do sítio já na época dos
Romanos, tendo mesmo aqui existido um importante núcleo urbano, a cidade romana
de Singa. Em 1233, no reinado de D. Sancho II, o concelho foi doado à Ordem de
Santiago da Espada, como recompensa pelo seu papel na reconquista cristã da
Península.
A Ordem
promoveu o desenvolvimento e o cultivo das terras, que se encontravam então
praticamente desertas, e construiu na zona alta de Ferreira um imponente
castelo. Posteriormente, o domínio das terras passou para os duques de Aveiro
e, depois da conspiração destes contra o rei D. José, passou para a Coroa.
Em 1838, o
castelo, já em adiantado estado de ruína, foi demolido tendo sido construído no
seu lugar o cemitério público.
O Património
edificado de Ferreira do Alentejo possui uma forte componente religiosa, destacando-se
a Igreja Matriz, do século XIV, no
interior da qual se encontra uma imagem Nossa Senhora da Conceição, imagem essa
que acompanhou o navegador português Vasco da Gama na descoberta do Caminho Marítimo
para a Índia (ela apenas se encontra na igreja matriz por questões de
segurança, pois é propriedade da Igreja de Nossa Senhora da Conceição), a Igreja da Misericórdia, do século XVI, com
um bonito pórtico Manuelino, e onde está hoje instalado o Núcleo de Arte Sacra
do Museu Municipal de Ferreira e a Igreja
de Nossa Senhora da Conceição.
A visita,
valorizada pelos conhecimentos e pela simpatia do Francisco Horta, depois de se
iniciar na Praça do Comendador Infante Passanha, uma agradável e tranquila praça
com um bonito piso em calçada portuguesa, prosseguiu até à igreja Matriz após o
que nos dirigimos até ao Museu Municipal
de Ferreira.
Este museu, que
ocupa parte da Casa Agrícola Jorge Ribeiro de Sousa, um interessante edifício
com características arquitetónicas da segunda metade do século XIX, foi inaugurado
em Outubro de 2004, e encerra um rico espólio que documenta a evolução da
ocupação humana deste território, desde o 4.º milénio até ao século XIX, promovendo
a divulgação dos bens culturais representativos do modo de vida das gentes do
Concelho.
O objectivo
seguinte foi o Núcleo de Arte Sacra
do Museu Municipal de Ferreira, inaugurado em Dezembro de 2014, que se encontra
instalado na antiga Igreja da Misericórdia, ocupando ainda parte das
instalações do antigo hospital.
O primeiro
piso é dedicado, à ação religiosa e espiritual desenvolvida pela Santa Casa da
Misericórdia de Ferreira do Alentejo, desde o ano de 1516, altura em que
recebeu o seu compromisso das mãos do rei D. Manuel I, enquanto o segundo piso documenta
a atividade assistencial e hospitalar, desde o século XV até aos nossos dias.
O nosso
périplo por Ferreira concluiu-se na Casa
do Vinho e do Cante, a antiga Adega
do Lélito.
Com o
objectivo de recuperar e preservar a memória das antigas tabernas tradicionais,
a Câmara Municipal criou este núcleo museológico, na antiga Adega do Zé Lélito,
fechada há cerca de 10 anos.
Inaugurada
em Setembro de 2017, esta Casa do Vinho
e do Cante pretende valorizar as manifestações culturais como a arte do
vinho de talha, produzido em Portugal desde a época dos romanos, a poesia
popular e o cante alentejano.
E foi neste
ambiente único que tivemos oportunidade de um agradável convívio ao qual não
faltou a bebida de um “branqueal”, termo que designa um pequeno copo de vinho
branco, gentilmente oferecido pelo Francisco Horta.
Foi um final
em beleza para esta nossa visita, que nos deu a conhecer uma realidade viva com
uma actividade meritória, na preservação da
memória coletiva e na salvaguarda e divulgação do Património Cultural do
Concelho de Ferreira do Alentejo e das suas gentes.
O almoço foi no restaurante O Chico,
onde pudemos encher o bandulho (a fome já apertava…) com a boa cozinha
alentejana, devidamente regada com o inevitável DOC...
A parte da tarde estava reservada para a
visita ao Vale da Rosa, que é actualmente o maior produtor nacional de uva de mesa,
com uma área de produção de cerca de 250 hectares e 13 variedades de uva.
A sua
actividade constitui já um importante pólo de desenvolvimento económico da
região, colaborando com o município, em inúmeras iniciativas de carácter social,
como a promoção do desporto e a cooperação com instituições de solidariedade
social.
Fomos
recebidos com uma sessão de apresentação, na qual pudemos apreciar algumas
das variedades de uvas aqui produzidas, com destaque para as uvas sem grainha que,
ficamos a saber, se trata de um fruto 100% natural, cuja ausência da grainha
resulta do não desenvolvimento do embrião.
Aqui tivemos uma surpresa bem agradável, pois viemos aqui encontrar o Nuno e a esposa, que foram os nossos simpáticos anfitriões na visita a Vila Velha de Ródão, que efectuámos em 3 de Outubro de 2014, e que agora aqui trabalham.
Aqui tivemos uma surpresa bem agradável, pois viemos aqui encontrar o Nuno e a esposa, que foram os nossos simpáticos anfitriões na visita a Vila Velha de Ródão, que efectuámos em 3 de Outubro de 2014, e que agora aqui trabalham.
Foi o
próprio Nuno que nos guiou num giro, de trator e atrelado, pelas vinhas, onde
pudemos apreciar in loco a qualidade das uvas aqui produzidas.
Já o sol se
começava a esconder no horizonte pintado de vermelho, quando iniciámos o
regresso à capital, depois de um dia enriquecedor e bem preenchido, nestas
terras de Além do Tejo.
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