O MEDO, O TEATRO E A VIDA, A ILUSÃO E A REALIDADE

Numa Alemanha já dominada pelo nazismo o medo paira ameaçador no quotidiano da sua população. Já não são só os bufos, as polícias, as milícias, é no próprio seio das famílias dentro das suas casas, os empregados, os amigos e, roçando o absurdo, são os próprios filhos que são instruídos a denunciarem os pais. O sufoco é total, a angústia, a incerteza e o medo infiltram-se por todos os poros da forma mais cruel e absurda... noutro registo, noutro local, dois amantes clandestinos temem pela descoberta do seu segredo; é um outro medo, é um medo individual cuja causa nasce dos comportamentos assumidos como censuráveis pela sociedade e pelos seus próprios autores... mas de repente o conflito amoroso salta violentamente das personagens de Pirandello para os actores, eles próprios personagens de uma terceira peça de teatro, idealizada pela Isilda Paulo, é o teatro dentro do teatro... e no final uma quarta peça em que os actores representaram o seu papel de pessoas reais (?) perante os presentes, que também encarnaram compenetradamente o seu papel de espectadores... é a realidade do teatro, é a ilusão da vida, é o teatro a entrar pela vida e a vida a entrar pelo teatro. Onde começa a realidade? Onde acaba o teatro? Qual é o nosso papel no teatro das nossas vidas? Estaremos a interpretá-lo à altura do exigido?
Estas e algumas outras interrogações sobre a vida o teatro e o medo, resultaram da peça “Ensaio sobre o Medo” (1) que nos foi apresentada pelo Grupo Artes Cénicas, no passado dia 24 de Abril no auditório da Associação de Moradores 18 de Maio.
Foi a comemoração certa do trigésimo sexto aniversário do acto libertador que pôs fim a alguns dos medos que sufocavam então as nossas vidas e a nossa sociedade.
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(1) “Ensaio sobre o Medo” reúne duas peças dum só acto. A primeira, “O Espião” de Bertold Brecht e a segunda, “O Torno” de Luigi Pirandello, ambas sobre o tema do medo. A ligação destas duas peças é feita por uma terceira peça da autoria de Isilda Paulo do Grupo Artes Cénicas.