sexta-feira, junho 05, 2020

25 Abril 74 - as memórias do Jorge Menezes


Em Abril de 1974, sobretudo por influência do mano mais velho, estudante de direito em Coimbra, já tinha uma consciência politica razoavelmente consistente que me permitia longas discussões em casa de um dos amigos mais velhos, um deles com experiência das lutas estudantinas coimbrãs.
No dia 25, preparava-me para ir trabalhar para a Repartição de Finanças da Horta quando o meu pai regressando das compras diárias do mercado municipal disse-nos que qualquer coisa “politica” se tinha passado no Continente mas que ainda era tudo muito vago.
Sintonizadas diversas estações de rádio, nenhuma informação, só música (a televisão apenas chegou aos Açores em agosto de 1975 exceção às Flores e Corvo, onde só foi possível fazer chegar o sinal em 1988).
Saí sem saber nada de concreto, quando cheguei à Repartição o chefe informou que tinha recebido ordem de Lisboa para manter encerrados os serviços nesse dia. Procurei então aqueles meus amigos, a que se juntou o mano terceiro, e onde nos mantivemos todo o dia na casa de um deles agarrados ao rádio (os telefonemas eram caros e as ligações eram feitas através das operadoras dos CTT, o que antes de estar tudo esclarecido não convinha!).
Pela hora do almoço, penso que já tinha havido o primeiro comunicado do MFA, e era praticamente consistente a informação de que o fascismo tinha sido derrotado (naquela altura a hora nos Açores era inferior a 2 horas do que no Continente). Lembro-me mais tarde quando cheguei a minha casa ter encontrado os meus pais felicíssimos, sobretudo porque anteviam que a guerra colonial iria acabar e que os três filhos mais velhos, tínhamos 19, 20 e 22 anos, já não iriam para a guerra (o mais velho estava mobilizado para a Guiné)!
Medo que os perseguia sem nós sabermos, ter três filhos em simultâneo em “África”!
Em agosto fui de férias a Lisboa, pedi “audiência” ao Director-Geral dos Impostos já com requerimento em papel selado para pedir transferência para uma Repartição de Finanças da capital com argumento forte - tirar curso de economia como trabalhador estudante. Saí do gabinete do Director-Geral com o despacho positivo. Infelizmente, tive que aguardar um ano para entrar no ISEG porque não foram aceites inscrições no ano lectivo 74/75.
O resto foi o que todos fizemos, andar constantemente em luta e manifes porque “FASCISMO NUNCA MAIS!”.

Jorge Menezes, em Junho 2020