domingo, maio 24, 2020

25 Abril 74 - as memórias da Fernanda e do Pedro


O dia 25 de Abril de 1974 amanheceu em Silva Porto como qualquer outro dia…
Estávamos no centro de Angola, um por obrigação militar e o outro por solidariedade e aproveitando para dar umas aulas de matemática no liceu da cidade, substituindo o professor da cadeira a fazer estágio em Luanda.
No quartel o dia decorreu com a maior normalidade, sem qualquer indício de que estivesse sucedendo alguma coisa vem território português.
No liceu, durante a pausa da manhã para o café, um dos professores, bem estabelecido na cidade, referiu ter tido conhecimento de que alguns militares “lá pela metrópole” ter-se-iam “mexido” porque, ganhando pouco, queriam ser aumentados.
Ao final do dia continuávamos na ignorância total de tudo o que se passava…
No dia seguinte…tudo na mesma. Aí um grupo de quatro casais amigos, quatro militares milicianos e digníssimas companheiras, resolveram combinar um jantar em casa de um deles, onde havia uma pequena telefonia e cuja mulher gostava de cozinhar. O objectivo principal era ouvir a BBC e tentar perceber o que verdadeiramente se passava nesta terra longínqua.
Com oito cabeças à volta de um cubo com uns trinta centímetros de aresta, com interferências constantes e com notícias transmitidas em inglês o resultado foi ficarmos com a certeza de que alguma coisa estava mesmo a acontecer em Portugal e que eram militares à frente do processo. Mas ficavam dúvidas: que militares? De direita? De esquerda? O que é que verdadeiramente pretendiam? Maiores salários?
Mudanças políticas? Este serão terminou tarde, com muitas discussões.
Passados uns dias (3,4,5?) o então e ainda governador de Angola, Santos e Castro, faz uma declaração transmitida com pompa e circunstância, esclarecendo pouco, mas dizendo que deviam estar todos calmos porque, apesar da intervenção militar na metrópole, em Angola tudo continuaria como até ali…
Deu para rir porque nesta altura já íamos sabendo que não era bem assim… afinal não haviam reivindicações salariais, presos políticos eram libertados, voltavam ao país políticos exilados, etc. mas ainda nos lembramos de uma dúvida que persistia: o que fazia e porque estava o Spínola no meio de tudo?
Uma coisa é certa, festejámos o 25 de Abril de 1974 quando por volta do dia 8, 9 10..(???) de Maio fomos ao cinema de Silva Porto, não para ver o filme que lá passava, mas para ver os documentários sobre o 25 de Abril e 1º de Maio. Aí sim, foi uma festa, houve lágrimas, beijos, abraços…
E voltámos outro dia para ver de novo…
Fernanda e Pedro, Abril 2020