domingo, fevereiro 05, 2023

Na Biblioteca Orlando Ribeiro, o fogo do Amor aqueceu um convívio do Atrium com o Eduardo Gageiro


No passado dia 28 de janeiro embarcámos numa viagem, conduzidos pela palavra de Eduardo Gageiro, que se iniciou no ano de 1947, na Fábrica de Loiça de Sacavém, quando um jovem paquete de 12 anos, ao desempenhar as suas tarefas rotineiras de trazer e levar recados, começou a reparar e a interessar-se pelas decorações das louças e a conhecer os pintores, escultores e operários fabris, que as criavam e produziam.
Fora o seu pai, proprietário de um pequeno estabelecimento comercial, situado em frente da fábrica, que tomou a decisão de escolher a fábrica, em vez da escola, como o meio mais certo para assegurar o futuro profissional do jovem.

Mas a sensibilidade deste não se limitava aos aspectos meramente artísticos. A visão que tinha ao sair da fábrica, dos seus antigos operários a pedirem esmola, iria marcar a sua vida, que seria dedicada à denuncia de toda a miséria social.

Mas o “bichinho” da fotografia já o tinha contaminado, e com a pequena máquina fotográfica de plástico de seu irmão, o nosso jovem dava os primeiros passos na arte. No vai e vem da sua tarefa de paquete, a pequena máquina não tinha descanso…

Certo dia o escultor Armando Mesquita (1907 – 1982), um dos muitos artistas que colaborava com a Fábrica, ao ver as fotografias do jovem paquete, comentou "tu tens olho para a coisa, mas não percebes nada disto…". Algum tempo depois, o atelier do escultor tinha ganho um aplicado aluno que começava as suas primeiras aulas de arte e composição.

E a formação, aliada às excepcionais qualidades do aluno-paquete, deu o resultado que hoje todos sabemos. Começou aos 12 anos com dois primeiros prémios num concurso do Diário de Notícias, e a publicação da sua primeira foto na capa do jornal, depois não mais parou. Fotógrafo do Diário Ilustrado, do Século Ilustrado, da Revista Eva, do Almanaque, do Match Magazine, da Associated Press (Portugal), da Companhia Nacional de Bailado, da Assembleia da República e da Presidência da República. Trabalhou para a Deustche Gramophone - Alemanha, Yamaha - Japão e para a Cartier.

Condecorado com a Ordem do Infante D. Henrique, é autor de centenas de fotografias históricas da revolução de 25 de Abril de 1974, tendo fixado as imagens dos militares no Terreiro do Paço, o assalto à sede da PIDE, e o momento em que o capitão Salgueiro Maia, depois de obter a rendição dos carros de combate de Cavalaria 7, regressa cerrando os dentes e mordendo o lábio (mais tarde confessa que o fez para não chorar, pois ali tinha percebido que a revolução triunfara).

Durante a Ditadura foi preso pela PIDE e passou dois meses na prisão de Caxias. Acabou por ser libertado, devido à pressão de outros fotógrafos e jornalistas.

Os prémios nacionais e internacionais são inúmeros, enchíamos várias páginas do blogue a mencioná-los.

E foi esse mesmo jovem, empregado na Fábrica de Louça de Sacavém, hoje um consagrado fotógrafo, na força dos seus 88 anos, que nos recebeu com uma gentileza e uma disponibilidade inexcedíveis na Biblioteca Orlando Ribeiro, onde está patente a sua mais recente exposição "Amor é um fogo que arde sem se ver".

Esta mostra, constituindo uma verdadeira "volta ao mundo" por Portugal e outros 18 países", como nos explicou Eduardo Gageiro, é inspirada num dos mais conhecidos sonetos de Camões, recuperando imagens captadas ao longo das últimas décadas, testemunhando diferentes visões e manifestações sobre amor e amizade.

Foi um interessante convívio no qual tivemos oportunidade de mostrar o nosso reconhecimento da simpatia do mestre fotógrafo, presenteando-o com um quadro do nosso companheiro Albano, “O almoço dos trolhas”, uma composição na linha das fotos de Gageiro, denunciando a dura vida dos explorados.

Já no final da tarde, após o inevitável momento para os autógrafos, regressámos a nossas casas com o olhar renovado sobre a amizade e o amor, depois deste encontro com o mais premiado fotógrafo português.











Esta é a foto “Nazaré” que originou a prisão de Eduardo Gageiro