terça-feira, novembro 18, 2025

Um Magusto por terras do Ribatejo

 

Este ano festejámos o São Martinho nas Boiças, em casa da Marina e do Zé Carlos, no passado dia 9 de novembro.

Foi uma jornada que proporcionou momentos de alegre convívio, que se iniciou com um suculento almoço, ao qual não faltaram as indispensáveis castanhas e a água-pé.

Seguiram-se algumas actividades, de interpretação artística de poesia, de orientação espacial às apalpadelas e de destreza e pontaria no derrube de algumas personagens pouco recomendáveis.

As boas condições meteorológicas ajudaram ao êxito deste Magusto de 2025.






quarta-feira, outubro 29, 2025

Os painéis de Almada que incomodaram o regime salazarista

 

Os senhores do regime queriam as gares marítimas, de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos, decoradas com painéis espetaculares que servissem de instrumentos de propaganda à sua ideologia fascista, mas foi Almada Negreiros que fez o seu espetáculo.

Com irreverência e sem cedências, retratou o Portugal triste dos anos quarenta do século passado, a Lisboa ribeirinha, com varinas de pés descalços, pescadores, marinheiros, saltimbancos que pedem esmola e também com o drama dos imigrantes que tinham de partir para fugir à miséria. No fundo eram as cenas reais da vida que ali acontecia mesmo, no cais da capital do então império.

A afronta ao regime foi tal que a sua destruição chegou a ser sugerida ao velho ditador, valendo a intervenção de António Ferro defendendo a qualidade inquestionável dos murais e também do arquiteto Porfírio Pardal Monteiro, autor dos projectos das duas gares marítimas.

E foi no passado dia 23 de outubro que o Atrium efectuou uma visita guiada aos painéis das duas gares, que se iniciou no Centro Interpretativo, situado no piso 0 da Gare Marítima de Alcântara, que conta com nove salas que nos conduzem numa viagem pela história do Porto de Lisboa, mostrando a importância da construção das Gares Marítimas e o processo criativo de Almada Negreiros na elaboração dos murais, na década de 1940.

Nas salas «Cais», «Passagens», «Partidas» e «Chegadas» é apresentada a história da construção das Gares de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos, bem como a passagem de alguns acontecimentos históricos pelas mesmas, como a II Guerra Mundial (êxodo sem precedentes de gente em fuga da guerra da Europa, escapando aos regimes nazi e fascista da Alemanha e da Itália), a emigração, os embarques para a Guerra Colonial (foi daqui que partiram ao longo de 13 anos de guerra, 800 mil soldados com 500 mil africanos incorporados no exército português) e a subsequente descolonização e regresso dos portugueses das ex-colónias. As gares abriram pela primeira vez em 1943 e 1949, distam entre si cerca de 800 metros.

Os icónicos painéis de Almada mostram o eterno transgressor, e apesar da obra ter resultado de uma encomenda, tudo o que neles se vê é exclusivo do seu talento que ajustou o tom provocatório às narrativas que se propôs contar.

Escolheu a Nau Catrineta, lengalenga popular que falava das desventuras dos marinheiros numa travessia marítima para evocar os Descobrimentos, ilustrou o milagre de D. Fuas Roupinho salvo à beira do abismo, retratou o Portugal rústico e a Lisboa ribeirinha, com varinas de corpos robustos e pés descalços, pescadores e marinheiros em primeiro plano.

As pinturas, destinadas a receber ilustres viajantes estrangeiros no novíssimo cais de Lisboa, foram mal acolhidas pelo ministro Duarte Pacheco que terá mesmo classificá-las como “uns mamarrachos”. Obviamente, o país retratado com modernismo e realismo social a mais, não servia o figurino da política cultural então vigente.

Se na Gare de Alcântara ainda existia alguma ligação temática à História de Portugal, na Rocha do Conde de Óbidos a perspetiva foi colocada nos que sofrem, no drama dos que têm de partir para fugir à miséria, nos saltimbancos que pedem esmola.

A concluir, recorde-se que o restauro dos 14 murais das Gares foi finalizado recentemente, através de um financiamento garantido pela World Monuments Fund, uma organização sem fins lucrativos que tem como missão a salvaguarda de património cultural insubstituível em todo o mundo, com um programa bianual designado World Monuments Watch que a cada edição seleciona 25 lugares em diferentes geografias com notória relevância histórico-artística.

Foi uma visita enriquecedora que terminou num animado almoço no restaurante “O último porto”.













segunda-feira, outubro 20, 2025

No Teatro Camões recordando “Os Maias” de Eça de Queirós, agora bailado pela CNB

 

Foi no passado dia 16 que o Atrium rumou até à beira Tejo, ao Teatro Camões para assistir ao bailado que evoca, reinterpreta e dá vida a personagens e a questões intemporais, criadas pela pena implacável de Eça de Queirós, apresentando a dança como linguagem de emoções, que transporta para o presente o tempo passado, num diálogo muito belo.

Com coreografia do diretor da Companhia Nacional de Bailado, Fernando Duarte, a peça tem curadoria musical de Andrea Lupi, cenografia de José Manuel Castanheira e figurinos de José António Tenente, além de um elenco de mais de trinta bailarinos.

A parte musical conta com pianista António Rosado e solistas da Orquestra de Câmara Portuguesa, estando a curadoria musical a cargo de Andrea Lupi, que optou por compositores como o belga César Franck, contemporâneo de Eça, e a austríaca Maria Theresia Von Paradis, que viveu a viragem do século XVIII para o seguinte, estabelecendo uma linha através do tempo da ação.

Como afirmou Fernando Duarte, "A ideia não foi competir com o livro, porque o livro ganhará sempre, mas antes impulsionar a sua (re)leitura, quer para quem já o conhece, quer para quem poderá ficar desperto para o fazer". Na verdade, entre os atriunistas presentes vários foram os exercícios de recordação das leituras feitas à obra de Eça, mais tarde completados com a leitura de resumos da mesma.

Recordemos então que “Os Maias” foi uma das obras mais conhecidas do escritor, publicada em 1888, que narra a história de três gerações da família, centrando-se na mais recente, com a história de amor entre Carlos e Maria Eduarda, dois dos personagens que parecem estar à mercê de um destino que os conduz à perdição.

O livro encerra uma crónica de costumes, retratando, com rigor fotográfico, a sociedade lisboeta da segunda metade do século XIX, e vale principalmente pela ironia com que o autor define os caracteres e apresenta as situações. É um romance realista (e naturalista), onde não faltam o fatalismo, a análise social, as peripécias e a catástrofe próprios do enredo passional, e nele o autor faz uma crítica à situação decadente do país (a nível político e cultural) e à alta burguesia lisboeta oitocentista, por onde perpassa um humor (ora fino, ora satírico) que configura a derrota e o desengano de todas as personagens.

A história de Carlos da Maia e Maria Eduarda, além das nove apresentações em Lisboa, está prevista viajar pelo país, e o bailado terá uma apresentação também no Lódz Ballet Festival, na Polónia, no Dia Mundial da Dança, a 29 de abril de 2026, e em 30 de abril, no Teatro Wielki Lodzi.

E nada melhor para terminar esta simples crónica sobre o bailado “Os Maias”, do que recordar a prosa elegante e corrosiva de Eça, com que termina este seu livro.

“…Depois Carlos, outra vez sério, deu a sua teoria da vida, a teoria definitiva que ele deduzira da experiência e que agora o governava. Era o fatalismo muçulmano. Nada desejar e nada recear... Não se abandonar a uma esperança - nem a um desapontamento. Tudo aceitar, o que vem e o que foge, com a tranquilidade com que se acolhem as naturais mudanças de dias agrestes e de dias suaves. E, nesta placidez, deixar esse pedaço de matéria organizada, que se chama o Eu, ir-se deteriorando e decompondo até reentrar e se perder no infinito Universo.... Sobretudo não ter apetites. E, mais que tudo, não ter contrariedades.

Ega, em suma, concordava. Do que ele principalmente se convencera, nesses estreitos anos de vida, era da inutilidade do todo o esforço. Não valia a pena dar um passo para alcançar coisa alguma na terra - porque tudo se resolve, como já ensinara o sábio do Eclesiastes, em desilusão e poeira.

- Se me dissessem que ali em baixo estava uma fortuna como a dos Rotschilds ou a coroa imperial de Carlos V, à minha espera, para serem minhas se eu para lá corresse, eu não apressava o passo... Não! Não saia deste passinho lento, prudente, correcto, seguro, que é o único que se deve ter na vida.

- Nem eu! acudiu Carlos com uma convicção decisiva.

E ambos retardaram o passo, descendo para a rampa de Santos, como se aquele fosse em verdade o caminho da vida, onde eles, certos de só encontrar ao fim desilusão e poeira, não devessem jamais avançar senão com lentidão e desdém. Já avistavam o Aterro, a sua longa fila de luzes. De repente Carlos teve um largo gesto de contrariedade:

- Que ferro! E eu que vinha desde Paris com este apetite! Esqueci-me de mandar fazer hoje para o jantar um grande prato de paio com ervilhas.

E agora já era tarde, lembrou Ega. Então Carlos, até aí esquecido em memórias do passado e síntese da existência, pareceu ter inesperadamente consciência da noite que caíra, dos candeeiros acesos. A um bico de gás tirou o relógio. Eram seis e um quarto!

- Oh, diabo!... E eu que disse ao Vilaça e aos rapazes para estarem no Braganza pontualmente ás seis! Não aparecer por aí uma tipóia!...

- Espera! exclamou Ega. Lá vem um «Americano», ainda o apanhamos.

- Ainda o apanhamos!

Os dois amigos lançaram o passo, largamente. E Carlos, que arrojara o charuto, ia dizendo na aragem fina e fria que lhes cortava a face:

- Que raiva ter esquecido o paiosinho! Enfim, acabou-se. Ao menos assentamos a teoria definitiva da existência. Com efeito, não vale a pena fazer um esforço, correr com ânsia para coisa alguma...

Ega, ao lado, ajuntava, ofegante, atirando as pernas magras:

- Nem para o amor, nem para a gloria, nem para o dinheiro, nem para o poder...

A lanterna vermelha do «Americano», ao longe, no escuro, parara. E foi em Carlos e em João da Ega uma esperança, outro esforço:

- Ainda o apanhamos!

De novo a lanterna deslizou, e fugiu. Então, para apanhar o «Americano», os dois amigos romperam a correr desesperadamente pela rampa de Santos e pelo Aterro, sob a primeira claridade do luar que subia.”





segunda-feira, junho 16, 2025

O Atrium comemorou o seu 43º aniversário em S. João da Caparica

E quatro anos depois voltámos a São João da Caparica, à casa da Manecas, para comemorar mais um aniversário do nosso Atrium. Desta vez o 43º, mas desta vez sem as incómodas máscaras que o maldito vírus nos impunha na altura (lembram-se que até organizámos um concurso de decoração das máscaras anti-covid…? A nossa imaginação não conhece fronteiras…). Aqui fica uma foto para recordar aqueles tempos sombrios que já estão ultrapassados.

Celebremos então a festa do ano quarenta e três, que decorreu com um animado convívio, e com ricas colaborações.

Recordemos: a escolha por cada participante, de um objecto, e a descrição da história a ele associada; a extraordinária actuação de um grupo de jograis, constituído pelos elementos do grupo organizador da festa; uma bem conseguida, e bem afinada, sessão de cantigas ao desafio a cargo de quatro equipas formadas ad-hoc…

A tudo isto, como já é habitual juntaram-se os excelentes comes e os bebes, tudo se conjugando para uma comemoração bem animada e prometedora de mais uma série de anos com força para continuar a levar por diante o nosso projecto iniciado em 1982…

Parabéns Atrium!









quarta-feira, junho 11, 2025

Um encontro com a cultura milenar chinesa no Centro Científico e Cultural de Macau

Foi no passado dia 7 de maio que o Atrium se encontrou no Centro Científico e Cultural de Macau, para uma visita guiada pela Professora Ana Cristina, que nos transportou, através da história de Macau, numa viagem ao encontro da cultura chinesa e das relações históricas entre Portugal e a China.

O museu desenvolve-se em redor de um jardim de estilo tipicamente chinês, criando um ambiente que pretende expressar a harmonia com a natureza, e é constituído por dois núcleos, um sobre a condição histórico-cultural de Macau nos séculos XVI e XVII e outro que contém a Colecção de Arte Chinesa, constituída por mais de 3500 peças.

O núcleo “A Condição Histórico-Cultural de Macau nos Séculos XVI e XVII” remete para a atmosfera internacional da China Ming e para a fronteira intercultural Europa-China, criada com a cidade portuária de Macau, estando presentes alguns resultados da investigação sobre a história das relações luso-chinesas e a história de Macau.

No núcleo “Uma Colecção de Arte Chinesa”, podemos apreciar colecções principalmente de terracotas, grés, e porcelanas, bem como diversos aspectos da Arte, Cultura e Sociedade chinesas. Trata-se da única colecção sistemática da Arte Chinesa existente nas instituições museológicas de Portugal.

Possui ainda uma extensa biblioteca especializada e dedicada à investigação e ensino sobre as relações entre a Europa e a Ásia e sobre a História Contemporânea da China e de Macau.

Foi uma visita interessante que nos recordou aspectos da nossa história, desde a época das navegações até ao recente período da descolonização.

No final, como o calor apertava, a actividade terminou com um descontraído convívio, numa esplanada da área, na companhia de umas refrescantes imperiais…